“Eu conto história das quebradas do mundaréu. Lá de onde o vento encosta o lixo e as pregas botam os ovos. Falo da gente que sempre pega o pior, que come da banda podre, que mora na beira do rio e quase se afoga toda vez que chove, que só berra da geral sem nunca influir no resultado. Falo dessa gente que transa pelos estreitos, escamosos e esquisitos caminhos do roçado do bom Deus. Falo desse povão, que apesar de tudo, é generoso, apaixonado, alegre, esperançoso e crente numa existência melhor na paz de Oxalá”.
Plínio Marcos
“Ôôô seu Dionísio da Barra Funda, Inocêncio Mulata do Camisa Verde e Branco, Nenê da Vila Matilde, Vitucho, Marmelada, Jamburá, Sinval do Cambuci, Nego Braço, Carlão do Peruche, Pé Rachado do Vai-Vai, a gloriosa alvinegra do Bixiga. Pato n’água, Vassourinha, seu Zezinho do Morro, Dito Caipira da Unidos de Vila Maria..
A todos vocês que estão no samba desde o tempo do tamborim quadrado e do surdo de barricão. Tempo em que a polícia acabava com o pagode na base do chanfralho. Tempo que o negro pra sustentar samba na rua tinha que fazer e acontecer. A todos vocês eu peço licença.
Dona Sinhá da Barra Funda, Dona Eunice da Lavapés. Donata. Senhoras de valor provado nos desfiles da avenida. A benção tias e licença que eu vou falar do samba da Paulicéia. Juarez da Cruz da Mocidade Alegre do Bairro do Limão, Eduardo Basílio da Rosas de Ouro da Vila Brasilândia, Ângelo do Vai-Vai, Feijoada e Chiclé do Vai-Vai também, alô Mestre Mala, irmão lá do Tatuapé, o dono do samba, alô-alô Renato Correia de Castro, alô-alô Sarmento, vocês todos que são do samba, me deem licença que eu vou falar do samba da Paulicéia. Vou contar a história de Geraldão da Barra Funda, Zeca da Casa Verde e Toniquinho Batuqueiro. Três histórias do samba de São Paulo. Vou no balanço do samba dos batuqueiros de Santa Izabel. E vou na paz de Oxalá, que me guarda e guia”.